17 de setembro de 2007

CRÉDITO VETERINÁRIO SA

O “Regulamento para Creditação de Acções de Formação” apresentado pela Ordem dos Médicos Veterinários (OMV) à auscultação da profissão, suscita três grandes preocupações.

A primeira resulta da duplicidade de objectivos. Surge como forma de materializar os créditos obtidos pelos Médicos Veterinários em processo de “aprendizagem ao longo da vida” (ALV), aparentemente como primeiro e único objectivo, mas atrelado traz a revalidação da Cédula Profissional (CP).

Parece inócua a conjugação, mas não é… nem nos princípios, nem eventualmente nos fins.
Não o é em termos de princípio pois para isso existe o Regulamente de Inscrição na OMV, esse sim a suscitar uma alteração que incluísse a revalidação dessa inscrição. Ou então o regulamento deveria ser de Creditação e Revalidação da CP…
Não o é em termos de objectivos já que um processo de creditação de acções de formação não teria obrigatoriamente que resultar num processo de revalidação da CP. Aliás, dos resultados do inquérito à profissão referido na carta circular que divulga o projecto de regulamento, não refere nada sobre questões de revalidação da CP… pois essa questão não foi colocada. Então, porquê decorar o projecto de regulamento com dados de um inquérito que não incidiu na totalidade do projecto que agora se apresenta?

Concordo em absoluto com a revalidação da CP baseada em créditos obtidos em determinado período de tempo (acho até que os intervalos de 5 anos são exagerados), contudo, a ideia de conjugarem ambos os processos num mesmo sistema é totalmente absurda. O processo de revalidação não poderá beneficiar de outras actividades que não apenas as de formação em serviço? Um qualquer veterinário pode então arriscar-se a ganhar o prémio Nobel, mas nem por isso ver a sua cédula profissional revalidada.

A segunda preocupação recaí nas consequências a que o sistema conduz, tal qual está desenhado: a uma focalização em acções preparadas e organizadas para Médicos Veterinários, em detrimento de acções com um âmbito mais alargado, eventualmente em áreas profissionais “marginais” ou concorrenciais com outras profissões, que interessaria serem captadas por sectores da nossa profissão.

Por este sistema tais sectores revelar-se-ão menos atractivos e por isso a abandonar, progressivamente, em termos de actividade profissional; são exemplo os domínios da segurança alimentar, dos modos de produção biológico, dos sistemas agro-pecuários, do desenvolvimento rural e da assistência técnica multidisciplinar.

Este conceito de que só o que ou aquele que tramita acções a creditar pela OMV é bom e susceptível de receber crédito, pode conduzir a um desastre para a profissão: acelerar a caminho da sua “medicinização”. Ora este sistema deveria encorajar precisamente o contrário, caso tivesse que encorajar alguma outra coisa, que não apenas a ALV do Médico Veterinário

Por último: a incongruência. Parece até que quem redigiu o modelo foi tendo “visões” diferentes à medida que a tinta ia correndo.

Se a todas as acções (à excepção do prémio Nobel… entre outros), foi já atribuído um determinado crédito, porque raio de razão hão-de existir pedidos de creditação? Para a troco de 50 euros sabermos o que já está no regulamento (anexo 2)? Ainda assim se existe um Conselho para a Formação e Qualificação Profissional, porque razão é o Conselho Directivo a atribuir créditos? Então não se limita a confirmar os “valores de tabela”?

Parece existir aqui espaço para uma discricionariedade a todos os títulos intolerável.

Onde estão os critérios objectivos de avaliação das acções? Quem vai determinar que um dado conteúdo é actual ou não? Ou que o mesmo se adequa à prática Veterinária? E mesmo que assim fosse quem e quando são definidos os critérios de apreciação?

Julgo que a grande maioria dos profissionais deseja um processo de “Acreditação da ALV”; mas que a noiva não venha vestida de branco só por pudor… que haja muito mais transparência em todo o sistema é tão somente o que se pede.

Que razão justifica o estabelecimento de comparticipações pela apreciação dos processos? A que custos reais se pretende fazer face? Inaceitável que, pelo menos nesta fase de implementação de um sistema se destaquem já os custos em detrimento da sua objectividade.

Não é óbvio que muitas das “actividades passíveis de creditação” jamais submeterão à OMV qualquer pedido de creditação? Acham que a Universidade de Tennessee vai pedir à OMV a creditação do mestrado em Epidemiologia Veterinária, só porque um dos mestrandos é português? (Não levem o exemplo à letra). E para os múltiplos casais de veterinários… assinar uma revista científica dá crédito só para o assinante? Ou é preciso apresentar uma ficha de leitura?

E já agora uma última pergunta: Um blogue como este quanto é que vale? Ou será que tenho que manter o anonimato?

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Bloguista

Imagino que dedicou tempo e "miolo" a analisar a proposta da Ordem, o que é necessário, até porque algumas das reflexões já me tinha ocorrido, como também a outros colegas, certamente.

Estou consigo quando diz que ao nível dos princípios nada parece questionável, o que é importante é a FORMA!

Mas não foi isso que nos perguntaram? escapou-me alguma coisa?

O que discordo é da análise que faz sobre os inconvenientes de se envolverem os créditos com a revalidação da C. Profissional.

Acredito que não tenha dado por ela, mas se não houver relação causa/efeito, estamos a acreditar formação para "informar" os colegas?Essa não pode ter carácter apenas informativo/pedagógico

Parece que essa indicação tem de ter qualquer finalidade imediata e permitir organizar e programar o que nos interessa atingir como metas mínimas.

Concordo que cada um se dedica ao seu mundo de interesses, o que me parece também natural e legítimo.
Gostaria de saber como introduzir "as correcções" para evitar isso? Obrigam-nos "à força" a diversificar? A "variante" parece "pior" que o soneto.

FALV não é um conceito subjectivo e tem de haver a noção do que é , como se chega lá e para que se quer, pelo que as duas coisas ligadas são um método que talvez imponha alguns objectivos concretos e mensuráveis, senão é a confusão instalada.

Transparência só sabendo ao que se vai e o que se quer, por isso parece que devemos "saber" primeiro acerca da acreditação da FALV e depois as regras que a vão valorizar.

Fazer o contrário é capaz de ser asneira e se não houver entidades dispostas a submeter-se à acreditação, os respectivos clientes sabem certamente o que estão a fazer, calculo!Continuam como até aqui?!

Achei graça aos exemplos que deu do "nobel", da U.Tenesse e dos casais de vets, cumprimento-o, pelo humor.
Não se esqueceu dos que pedem as revistas emprestadas? ou dos que vão às bibliotecas? ou dos que as assinam e não as lêem? etc...

Também lhe deixo uma questão. Porque não pergunta à Ordem quanto vale o seu blog?

Alkimista

Clint disse...

Caro Alkimista

Apenas três comentários.

Sobre a FORMA… gato escaldado de água fria tem medo… Só de me lembrar do processo de revisão estatutária e da impermeabilidade do CD em aceitar contributos (alguns até bastante inócuos)…

Quanto à revalidação da CP… totalmente de acordo, como aliás escrevi… acho até cinco anos um prazo bastante dilatado. Não concordo é que a revalidação funcione em paralelo com a atribuição de créditos… em termos práticos a revalidação deve decorrer no âmbito do regulamento de inscrição na OMV (que já existe).
Parece uma questão de pormenor, mas não é, e se outras razões não houvesse há a questão da operacionalidade… afinal já somos quase 4000 no activo… imagine o CD a avaliar esses processos todos na mesma altura (e porquê o CD e não o Conselho para a Formação e Qualificação Profissional?).

Totalmente de acordo com “… devemos "saber" primeiro acerca da acreditação da FALV e depois as regras que a vão valorizar.”… prefiro até o seu conceito “Acreditação da FALV” em vem de “Creditação da ALV”. Por isso defendo que o Regulamento seja claro no reconhecimento de dois processos distintos: (1) o concurso a acções de formação previamente acreditadas pela OMV e (2) a apresentação pelo Médico Veterinário de actividades desenvolvidas por si com determinado crédito.

Um homem deve conhecer as suas limitações… O Ordem também.

Clint