14 de outubro de 2004

A AMBIÇÃO E A ÉTICA

Acordo de Bolonha à parte, e à parte muitos dos disparates, generalizações e/ou simplificações a que se está a reduzir esse acordo (a isto voltaremos mais tarde), parece inquestionável ser competência da Universidade lidar com a ambição e a ética inculcada aos discentes, sendo esta preocupação particularmente sentida para os cursos de Medicina Veterinária.

Não existem indicadores estatísticos que permitam relacionar a prática não ética com a origem universitária do profissional que a pratica, nem tão pouco a relação de causa-efeito com a ambição instilada a esses licenciados (futuros profissionais), formados nas Escolas de Medicina Veterinária, mas seria de facto interessante ter a percepção do eventual denominador universitário comum de incumprimento ético e deontológico.
Tal interesse é suscitado pela convicção de que à Universidade não caberá apenas o papel de transmitir conhecimentos de natureza mais ou menos científica e de oferecer metodologias de aplicação prática desses conhecimentos, mas sobretudo de saber enquadrar esse “sistema de ensino-aprendizagem” num adequado sistema de referência que tenha em conta a ambição e a ética.

Aquela mistura de vontade, desejo e atracção que os docentes universitários transmitem ao futuro profissional, particularmente nas situações práticas que de alguma forma “simulam” o futuro dia-a-dia desses profissionais: planeamento produtivo de uma exploração pecuária, actos clínicos, uma cirurgia, concepção e realização de Inquéritos Epidemiológicos ou concretização de um diagnóstico, avaliação do lay out de uma indústria alimentar, etc. etc., poderá, em muitas circunstâncias, sobrepor-se ao enquadramento ético desse exercício, de que as dificuldades de emprego são “apenas” enorme catalizador.
Seria de esperar que a Universidade clarificasse os discentes sobre como se articulam a ambição e a ética, não permitindo que subsistissem quaisquer dúvidas sobre o plano ocupado por cada um dos conceitos, como é habitual notar-se: que a ambição termina onde a ética começa, como se se tratassem de duas questões não miscíveis.

A ética, encarada como um conjunto de “regras” que regulam a conduta, neste caso dos Médicos Veterinários e que em termos do colectivo se plasmam no Código Deontológico, não se opõem ou castram a ambição, como muitos “empresários da profissão” julgam ou aprenderam na Universidade.
A atitude platónica de renunciar aos prazeres e à riqueza a favor da dedicação à virtude, tendo em vista a conquista da felicidade, não me parece aplicar-se a esta circunstância ou seja, não se trata de escolher entre a ambição e a ética, como alguns doutos fazedores de licenciados parecem atemorizar os jovens alunos.
A verdadeira tarefa da Escola reside em dotar o aluno de capacidades que possam manter no plano da ética as suas mais legítimas aspirações: a vontade e o desejo deverão assentar em preceitos éticos, em vez de ser colocados em campos opostos numa espécie de campo de batalha mental e emocional.

Interessante seria, de qualquer modo, conhecer a “estatística da ambição e da ética”, reportada a cada um dos cursos de Medicina Veterinária.
Talvez o Conselho Profissional e Deontológico da Ordem dos Médicos Veterinários (ou até de uma outra qualquer Ordem), saiba informar.

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